Em busca da inclusão

Milhões de pessoas portadoras de deficiência estão à margem da sociedade, sem trabalho e sem educação, e consistem numa força de trabalho produtiva e eficiente, que precisa ser incluída

Governos, empresários, trabalhadores e até a igreja estão debatendo a inclusão das pessoas portadoras de deficiências. A Campanha da fraternidade, lançada anulamente pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), em 2006 tem como tema “Fraternidade e Pessoas com Deficiência”.

 

Existem no Brasil, de acordo com o Censo Demográfico de 2000, cerca de 27 milhões de pessoas com deficiência, o que corresponde a 14,4% da população. Nas regiões do Nordeste elas passam de 18% enquanto em São Paulo, com a menor incidência do país, são 11,4%.

 

A lei brasileira trata da inclusão das Pessoas Portadores de Deficiência (PPDs) no mercado de trabalho, determinando que as empresas as empreguem cumprindo cotas proporcionais ao número total de empregados contratados. Para ver cumprida esta lei, órgãos públicos como o Ministério Público e as delegacias Regionais do Trabalho (DRTs) têm agido não apenas na fiscalização, mas também pelo estímulo ao cumprimento das cotas.

 

Um exemplo é o programa de Ação Interinstitucional da DRT de São Paulo, que discute com as empresas dificuldades como localizar pessoas aptas e capacitadas ao trabalho; treinar PPDs para ocuparem cargos; a criação de Banco de dados com o cadastro destas pessoas; além de estabelecer prazos para que as empresas cumpram a lei de cotas.

 

A primeira Convenção Coletiva de Trabalho que institui um Programa para Inclusão de Pessoas com Deficiência, assinada no dia 7 de março, é um resultado deste trabalho. Negociada por nove meses entre o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical e DRT de SP, a Convenção determina que as empresas deverão adequar o ambiente de trabalho para a acessibilidade dos PPDs e estabelece um cronograma das ações e contratações, prevendo o cumprimento de 100% das cotas até o início de 2008.

 

De acordo com o Gerente de relações Sindicais Trabalhaistas do Sindusfarma, Arnaldo Pedace, isso significa a contratação de aproximadamente 2000 PPDs nas indústrias farmacêuticas de São Paulo. A tabela prevê a contratação de 30% da cota ainda em 2006, de 31 a 60% em 2007 e 100% em 2008.

 

Formação

“Temos que vencer um problema cultural no país: as pessoas com deficiência muitas vezes são afastadas do meio social. Nossa principal dificuldade é a falta de qualificação destas pessoas”, explica Arnaldo Pedace. “Trata-se não apenas de cumprir a lei de cotas, mas de um trabalho social; temos que procurar estas pessoas, qualificar, oferecer treinamento específico para a função”, completa.

 

Para viabilizar o treinamento, as indústrias estão buscando instituições como o Senai e as Apaes, entre outras, para firmar convênios para o treinamento. “Internamente, também, elaboramos programas para conscientizar as pessoas que trabalham nas empresas sobre a convivência com as PPDs”, acrescenta Pedace. Financeiramente, o que mais exige investimento das empresas é a readaptação de suas plantas, para permitir a deficientes visuais e físicos o acesso às suas dependências.

 

Deficiência entra na pauta sindical

“O tema até agora não encantou trabalhadores e empresas”. A conclusão é do dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco, Carlos Aparício Clemente. Ele ajuda a desenvolver, há cinco anos, o Projeto Espaço Cidadania, sediado no prédio do Sindicato, que trata da inclusão das PPDs no mercado de trabalho.

 

Sua conclusão está baseada no estudo realizado pelo Dieese sobre as garantias à participação dos trabalhadores com deficiência nas negociações coletivas. A pesquisa apontou que, de 204 categorias profissionais, 42,7% das negociações nas indústrias, 32,9% do setor de serviços, 15,8% do comércio e 11,1% do setor rural tiveram alguma cláusula tratando do assunto.

 

De acordo com o Dieese, mais de 65% das cláusulas tratam exclusivamente da contratação e garantia de emprego de trabalhadores com deficiência. O coordenador de estudos e desenvolvimento do Dieese, Ademir Figueiredo, observa que, nas 204 categorias pesquisadas, 35% das conquistas se referem à inclusão da questão na negociação, 17% atingem diretamente o trabalhador e 26% tratam dos dependentes com deficiência. “O movimento sindical pode ajudar muito exercendo seu papel de luta em defesa dos trabalhadores”, enfatiza.

 

Para Carlos Aparício Clemente, isso significa aumentar a sensibilidade e o conhecimento dos trabalhadores e sindicatos sobre a questão. Se não totalmente ausente, o tema ainda é insípido na agenda sindical, na avaliação do dirigente. “As empresas têm dificuldade de manter no posto de trabalho seus próprios acidentados”, acentua Clemente. Baseado no censo de 2000 e na estimativa populacional do IBGE para 2004, ele calcula um universo de 16 milhões e 400 mil PPDs em idade de trabalhar “E hoje o movimento sindical começa a perceber que pode ser eficaz para a inclusão”, afirma.

 

O sindicalista alerta que, se a lei de cotas fosse cumprida pelo setor público e privado, isso significaria emprego para 685 mil pessoas, ficando, portando, mais de 15 milhões fora da cota. “O positivo são as muitas empresas sem o número exigido para contratar que estão contratando, como postos de gasolina, pequenos supermercados e centros de telemarketing”, lembra Clemente. Por outro lado, ele denuncia as grandes empresas que fazem o marketing da inclusão e não contratam: “Para essas, como grandes bancos, é preciso a caneta da fiscalização para forçar”.

 

Acidentes de trabalho geram deficiência

No Brasil, só no ano de 2003, a Previdência Social registrou 390.180 acidentes de trabalho, isso entre trabalhadores com carteira assinada. Destes:

• 2.582 morreram;

• 12.649 tiveram incapacidade permanente para o trabalho

• 21.208 sofreram doenças profissionais.

 

Portadores de Deficiências no mundo do trabalho

A Convenção 159 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), de 1983, define pessoa com deficiência como aquela “cuja possibilidade de conseguir, permanecer e progredir no emprego é substancialmente limitada em decorrência de uma reconhecida desvantagem física ou mental”. A partir desta referência, a OIT estima que as pessoas portadoras de deficiência representam 8% da população economicamente ativa do planeta. Em 1991 o Brasil ratificou essa Convenção.

 

O que diz a lei

O artigo 93 da Lei 8213/91 estabelece que todas as empresas privadas com 100 ou mais empregados têm de reservar vagas para pessoas com deficiência ou acidentes reabilitados, na seguinte proporção:

• 100 a 200 empregados: 2%

• 201 a 500 empregados: 3%

• 501 a 1000 empregados: 4%

• 1001 ou mais empregados: 5%

 

As empresas públicas devem reservar 5% das vagas para as pessoas com deficiência em todo concurso realizado, em igualdade de condições com os demais candidatos, conforme prevê o artigo 37 do Decreto 3298/99.

 

Para enquadrar o trabalhador em vaga reservada à Lei de Cotas, a empresa deve informá-lo e o trabalhador deve autorizar o enquadramento.

 

Benefício social

O Ministério da Previdência Social paga mensalmente benefícios no valor de um salário mínimo (R$ 350,00 a partir de abril) para pessoas portadoras de deficiência que comprovam renda familiar inferior a 25% do salário mínimo. Em janeiro de 2006 foram pagos 1.221.427 benefícios. O portador de deficiência que for registrado em um trabalho perde o benefício.

 

21 de setembro é o Dia Nacional de Luta da Pessoa Portadora de Deficiência, de acordo com a Lei 11.133, de 14 de julho de 2005. A data foi instituída pelo movimento social, em 1982, com todas as entidades nacionais. Tramita ainda, no Congresso Nacional, um projeto que institui o Estatuto do Portador de Deficiência. O Dia Internacional do Portador deDeficiência é 3 de dezembro.

 

(Matéria extraída da Revista Primeiro Plano, nº 1/ Abril 2006)

 

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